TUDA - pap.el el.etrônico

Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano I Número 12 - Dezembro 2009
Crônica - José Miranda Filho

Michael Bacol, "Rm 69", Oil on Canvas, 122 x 91 cms., 2003


O Aventurado

Da janela do escritório localizado no 5º andar de um prédio no centro da capital paulista, Pedro observava todo o movimento das pessoas que iam e vinham de um canto a outro da cidade. Aquilo lhe parecia mais um formigueiro de gente apressada ávida em encontrar um veio numa mina de ouro. Imaginava-se no meio daquela multidão. Cada um com seu pensamento absorto no passado, no presente ou no futuro. Em cada cabeça uma sentença. Pensava!

Nos seus 70 anos vividos, a maior parte deles passados sob uma esteira de sofrimentos que lhes deixaram profundas recordações, ele suspirava aliviado dos problemas que tivera de enfrentar na juventude, até atingir o ápice de sua carreira executiva bem-sucedida. Enquanto alguns colegas beneficiados pela sorte de terem pais abastados, ele sofria com a falta de recursos financeiros para prosseguir os estudos, e tornar-se um vencedor. Tudo era contado, um pedaço de lápis usado era recolhido da rua para economizar uns centavos a mais e lhe propiciar a compra de algum livro de que necessitava: assim economizava também o dinheiro que gastaria na condução para ir até a biblioteca pública. Lia jornais que encontrava, deixados em qualquer canto, e se inteirava dos acontecimentos do mundo. Tudo era medido, anotado e contabilizado. O tempo passou mais depressa do que ele esperava. Naquele dia de sol brilhante e ardido, finalmente ele contemplava, como gostava de fazer nos finais de expediente, a turba devassadora do asfalto.

Foram-se os anos dourados da puberdade. No fim do ano ele completaria 70 anos de idade. Sentado confortavelmente numa cadeira de couro flexível, diante de uma mesa de jacarandá repleta de processos, Pedro sentia-se livre de preconceitos, notadamente da cor e do passado paupérrimo. Tivera poucos amigos com quem partilhar sua emoção e difundir suas precisões. Ignorara tudo isso para o bem do seu futuro.

De repente, o telefone tocou:

- Pedro? Aqui, é o Quincas...Lembra-se de mim?

Como poderia esquecer de um ex-colega, por sinal, um dos mais abastados de sua turma!

- Estou ouvindo Quincas...pode falar...

- … que estou precisando falar com você. Quem me forneceu seu telefone foi o Celso...Lembra-se dele?

- Sim, perfeitamente...mas o que você quer falar comigo?

- Preciso de sua ajuda...estou numa pior... Entrei numa fria por causa das drogas...Cheguei ao fundo do poço.

Naquele instante, Pedro sentou-se absorto. Pensativo e preocupado propões-se a encontrá-lo em algum lugar da cidade. Quincas era fugitivo da justiça.